Há pessoas que engrandecem os cargos que ocupam, e outras que, mesmo depois de deixarem os cargos, continuam a servir, inspirar e orientar. Rodolfo Pinto da Luz reunia essas qualidades com rara integridade. Professor, reitor, secretário de educação, gestor público, humanista de gestos e não de slogans, foi, em todas as funções, um homem a serviço da vida.
No MONATRAN, sua memória não é apenas institucional, é fraterna. Ainda como reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, Rodolfo compreendeu a urgência de formar não apenas profissionais, mas cidadãos. Foi sob sua gestão que o Movimento Nacional de Educação no Trânsito encontrou, dentro da UFSC, o apoio que lhe deu legitimidade e visibilidade. Ao lado do presidente da entidade, Roberto Álvarez Bentes de Sá, viabilizou ações educativas que ultrapassaram os muros do campus, alcançando escolas, comunidades e gestores.
Mais tarde, como Secretário de Educação de Florianópolis, estendeu esse compromisso. Incentivou projetos voltados à segurança viária nas escolas da rede pública, compreendendo que o respeito no trânsito é expressão direta do respeito ao próximo e, por isso, deveria ser ensinado desde cedo.
Pessoalmente, tive o privilégio de contar com seu apoio firme e silencioso em um dos momentos mais desafiadores da história da mobilidade brasileira. Quando assumi, como professor cedido da UFSC ao Governo Federal, à presidência do Programa PARE, pioneira iniciativa nacional de valorização da vida no trânsito, e posteriormente a direção do Departamento Nacional de Trânsito, DENATRAN, e a presidência do Grupo Executivo de Redução de Acidentes de Trânsito, GERAT, da Presidência da República, Rodolfo lá estava. Atuou como conselheiro, como parceiro, como cidadão consciente de que o trânsito é também um campo de educação e cidadania. Foi nesse período, marcado pela aprovação e regulamentação do novo Código de Trânsito Brasileiro, que Rodolfo, com sua visão clara e seu compromisso ético, ofereceu apoio institucional fundamental à causa da vida.
Ele sabia que o trânsito reflete a cultura de um povo, e que salvar vidas depende menos de castigo e mais de responsabilidade cívica, valor que só se forma com educação de verdade.
Rodolfo era, acima de tudo, um humanista. Não um humanista de discurso, mas de prática. Era chamado, com justiça, de “o homem do diálogo”. Sabia ouvir, ponderar e decidir. E decidia com coragem, sem humilhar, sem emparedar. Sua autoridade vinha do respeito que impunha naturalmente, pela integridade com que conduzia cada gesto, cada escolha, cada palavra.
Por isso, a comparação com o presente é inevitável, e dolorosa. Muitas universidades públicas, infelizmente, parecem ter renegado seu papel formador. Tornaram-se redutos ideológicos, onde a liberdade virou palavra de efeito e o pensamento divergente é silenciado com desprezo. O passado é apagado, o contraditório é perseguido, e até a presença da polícia para garantir segurança é rejeitada. Campi vandalizados, prédios abandonados, alunos e professores amedrontados ou calados. Um cenário que Rodolfo, com certeza, não aceitaria. Ele compreendia que a universidade não é propriedade de grupos, mas patrimônio da sociedade, e que a verdadeira liberdade acadêmica só existe com responsabilidade, civilidade e abertura real ao debate.
Agora, como articulista, mas também como amigo e irmão, escrevo estas linhas com a alma tocada. A dor é funda, porque sua ausência será sentida em cada sala, em cada biblioteca, em cada decisão que exija coragem e clareza. Mas a gratidão é ainda maior. Porque Rodolfo Pinto da Luz foi o tipo de homem que ilumina enquanto vive, e que continua iluminando depois que parte.
Magnífico foi o seu título, mas mais magnífico ainda foi o ser humano que habitava aquele título. Um homem digno, sereno, justo, um verdadeiro educador, no sentido mais elevado da palavra. Descanse em paz, querido Rodolfo, sua luz permanece entre nós. E onde houver uma universidade que ainda ousa sonhar, e uma sociedade que ainda ousa respeitar a vida, seu nome será lembrado com respeito e esperança.
Jornalista, Mtb 0083569 / SP/BR, Doutor em Ciências Humanas e Mestre em História Econômica pela USP, Doutor Honoris Causa pela Faculdade de Ciências Sociais de Florianópolis – Cesusc, Membro Titular da Academia Brasileira de História, Comendador da Veneranda Ordem dos Cavaleiros da Concórdia, foi Prof. Adj. Dr. da UFSC, criou e coordenou o Programa PARE do Ministério dos Transportes, ex-Diretor do Departamento Nacional de Trânsito – DENATRAN, Secretário-Executivo do GERAT da Casa Civil da Presidência da República, Conselheiro Consultivo do Movimento Nacional de Educação no Trânsito – MONATRAN e TWO FLAGS POST – Publisher & Editor-in-Chief.